06 março 2025

Para Além do Arco-Íris ~ Capítulo 22 [ESPECIAL]



Capítulo 22

 


A noite em El Callao era densa, carregada de um silêncio que parecia esconder mais do que revelar. Leo, Nicolás e Lauriel caminhavam em silêncio pelas ruas estreitas e mal iluminadas, guiados apenas pela luz tênue da lua. A brisa noturna trazia consigo um cheiro de terra molhada e flores tropicais, mas também algo mais... algo que Leo não conseguia identificar, mas que o deixava inquieto.

Lauriel liderava o grupo com passos firmes, os seus olhos dourados a brilhar como faróis na escuridão. Ela parecia saber exactamente para onde ir, mas não compartilhava os seus planos. Nicolás, ao lado de Leo, segurava a sua mão com firmeza, como se temesse que algo os pudesse separar. Leo, por sua vez, sentia-se dividido entre a confiança em Nicolás e a desconfiança em relação àquela mulher enigmática que parecia saber demasiado. 

Nicolás, Leo e Lauriel sentiram um calafrio a percorrer as suas peles, como se uma tempestade estivesse prestes a eclodir. Havia uma tensão palpável entre Lauriel e Arcana, que, num canto sombrio, observava-os com uma expressão de frustração. Ele batia os dedos contra a madeira da mesa, o som repetitivo ecoava na sala silenciosa, reflectindo a sua irritação crescente.




O que é que tu sabes sobre os diamantes? - perguntou Arcana, por telepatia.

O tom calmo da sua voz mal disfarçava a sua ansiedade. Os seus olhos brilhavam com uma intensidade perturbadora. 

- Os diamantes são essenciais para o meu ritual. Como tal, deves entender que eu não posso permitir que ninguém se interponha no meu caminho!

Lauriel não se deixou intimidar. Ela parou na rua, cruzou os braços, com uma expressão inabalável. O seu coração pulsava rápido dentro do peito. Um leve tremor na mão traiu a sua determinação. Respirou fundo e respondeu em voz alta:

- Os diamantes têm poderes que vão além da tua compreensão, Arcana. Tu não podes controlá-los! - respondeu, desafiando-o com um olhar intenso. A sua voz ecoou pela vila, quase como um mantra, tentando fortalecer-se contra a ameaça iminente. 

Enquanto Lauriel falava, uma luta silenciosa desenrolava-se entre ela e Arcana, como se uma batalha mental estivesse a ocorrer. Arcana tentava invadir a sua mente, procurava respostas, mas ela mantinha-se firme. A sua aura iluminava o espaço ao redor. Os símbolos dos diamantes começaram a brilhar levemente, pulsando com a energia contida.

A frustração de Arcana intensificava-se. Não havia dúvidas que aquela mulher tinha alguma ligação aos diamantes! Ele avançou um passo. As sombras estenderam-se como um manto negro sobre Lauriel. 

- Tu podes ser forte, mas és ingénua. Acredita, eu estou disposto a tudo para ter o que quero! - declarou ele, com palavras que ecoavam como um veneno sussurrante.

Leo, de pé à margem, observou a cena com um nó no estômago. A tensão estava no ar, e o seu medo enraizava-se dentro dele. Ele sabia que havia mais segredos do que podia imaginar, e que o futuro de todos dependia das escolhas que fariam a seguir. Trocou um olhar com Nicolás. Percebeu imediatamente, pelo olhar de Nicolás, que este sabia perfeitamente o que se passava. Ficou irritado ao sentir-se excluído de algo tão importante.

- Para onde estamos a ir? - perguntou, quebrando finalmente o silêncio.

Lauriel não parou de caminhar, mas respondeu com uma voz suave, quase um sussurro:

- Estamos a ir para um lugar seguro. Há muita coisa que tu e o Rodrigo precisam de saber, mas não aqui. Não agora.

Nicolás olhou para Leo, tentando transmitir-lhe calma, mas Leo notou a tensão nos olhos do amigo. Ele sabia que Nicolás confiava plenamente em Lauriel, mas algo naquela situação não parecia certo. Nicolás sabia o que se passa.

- Nicolás…! O que…?

A pergunta de Leo ficou no ar. De repente, Nicolás parou bruscamente, erguendo uma mão para o silenciar. Os seus olhos fixaram-se num ponto distante, onde as sombras pareciam mover-se de forma estranha.

- Ele está aqui! – murmurou Nicolás, quase inaudivelmente.

- Quem? - perguntou Leo, mas antes que pudesse receber uma resposta, um som baixo e gutural ecoou na escuridão. Era como se a própria noite estivesse viva, respirando e observando.

Lauriel virou-se para os dois. Os olhos dela brilharam com uma intensidade quase assustadora!

- Corram!

Antes que pudessem reagir, as sombras ao redor começaram a mover-se, tomando formas humanóides, grotescas e ameaçadoras.

Leo sentiu o coração acelerar enquanto Nicolás o puxava, incitando-o a correr. Seguiram Lauriel, que parecia flutuar sobre o chão, os seus cabelos dourados a brilhar como fogo na escuridão. As sombras perseguiam-nos, sussurrando palavras numa língua desconhecida, mas que transmitiam uma sensação de puro mal.

- Caralho…! O que diabos são estas coisas? – gritou Leo, tentando acompanhar o ritmo frenético da fuga.

- Não são coisas! – respondeu Lauriel, sem olhar para trás. - São servos de Arcana! Ele sabe que estamos aqui e não nos vai deixar escapar facilmente!

Nicolás apertou a mão de Leo com mais força, como se prometesse protegê-lo a qualquer custo. Correram por becos e ruas estreitas, até que finalmente chegaram a uma pequena capela abandonada. Lauriel abriu a porta pesada de madeira com um gesto rápido e empurrou-os para dentro, fechando-a atrás deles.

Dentro da capela, o ar era pesado e mofado, mas seguro. As sombras não pareciam capazes de entrar, mas Leo podia ouvi-las a arranhar as paredes externas, a sussurrar e a rir.

- O que está a acontecer? - perguntou Leo, ofegante. - Quem é Arcana? E por que está atrás de nós?

Nicolás suspirou. Olhou para ele com uma expressão séria, mas compassiva.




- Arcana é um feiticeiro poderoso, alguém que busca controlar não apenas o Mundo Físico, mas também o Universo da Narrativa. Ele acredita que, ao dominar as narrativas, pode moldar a Realidade. E vocês os dois... Tu e o Rodrigo… Vocês fazem parte de uma história que ele não pode controlar. 

Lauriel acrescentou:

- Uma história que ele começou a escrever, mas que fugiu ao controlo dele!

Leo franziu a testa, confuso.

- História? O que queres dizer com isso?

Lauriel hesitou por um momento antes de responder:

- Leo… Hummmm… Não sei como explicar isto de outra maneira. Mas… Vocês não são reais. Não como pensam ser. Vocês são personagens. Criados. Vocês existem dentro dos escritos num Mundo que existe apenas porque está a ser narrado neste preciso momento!

O silêncio que se seguiu foi ensurdecedor. Leo sentiu o chão fugir debaixo dos seus pés. Olhou tanto para Lauriel, quanto para Nicolás, com ar incrédulo! 

- Isso é uma piada, não é? 

A sua voz vacilava entre incredulidade e raiva.




- Queres dizer que eu... Que tudo o que vivi... Tudo o que senti... Não é real?

Nicolás trocou olhares com Lauriel, exasperado. Não conseguia dizer nada. Leo, por outro lado, sentiu um aperto sufocante no peito. Não podia ser verdade! Ele lembrava-se da sua infância, das dores, das alegrias, do toque de Nicolás, do medo que sentia agora! Tudo aquilo era real! Tinha de ser real!

- Isso é um absurdo! – rugiu ele, dando um passo para trás. 

- Eu não sou um boneco num papel! Eu sinto! Eu penso! Eu amo! Eu tenho um filho, o Juca!

Lauriel suspirou, os olhos cheios de uma compaixão que apenas aumentava a revolta de Leo.

- Leo… Eu sei que é difícil aceitar, mas isso não torna a tua existência menos significativa. Vocês têm um papel a desempenhar. E Arcana sabe disso. Por isso quer controlar-vos. Eu e o Nicolás temos um papel a cumprir, também. E a seu tempo descobrirás qual é.

Leo sentiu o seu corpo tremer. Não sabia se era raiva, medo ou desespero. Talvez os três.

- Não! Eu sou real! Eu sou real...! – murmurou, a respiração acelerada, as mãos a tremerem.

Nicolás aproximou-se e segurou-lhe o rosto entre as mãos.

- Podes ser um personagem, Leo. Mas para mim, tu és tudo. Nada pode mudar isso. Acredita em mim.

E enquanto o som das sombras ecoava do lado de fora, Leo fechou os olhos, tentando desesperadamente encontrar um ponto de equilíbrio numa Realidade que, de repente, deixava de fazer sentido.


[Continua...]

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