18 junho 2020

Escrito nas Entrelinhas: Parte 1 ~ Capítulo 1

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Escrito nas Entrelinhas: Parte 1 ~ Capítulo 1




Quando a cabeça não tem juízo
E te consomes mais do que é preciso
O corpo é que paga
O corpo é que paga
Deix'ó pagar, deix'ó pagar
Se tu estas a gostar...

Deix'ó sofrer, deix'ó sofrer
Se isso te dá prazer...
Deix'ó cantar, deix'ó cantar
Se tu estas a gostar...
Deix'ó beijar, deix'ó beijar
Se tu estas a gostar...



*24 de Setembro de 2016*


O Outono havia começado dias antes. Por todo o lado, as folhas das árvores mudavam de cor. Inúmeros tons entre o castanho, o laranja e o vermelho, começavam a dominar a paisagem. Era uma época mesmo bonita para se viver em Grace Falls.

Jules adorava o Outono. Ele era um rapaz de dezasseis anos. Nascera e crescera naquela cidade, embora ambicionasse um dia pegar nas suas coisas e partir à descoberta do Mundo, tal como haviam feito a sua mãe, Laura, e a sua irmã mais velha, Bianca. Jules era um rapaz igual a tantos outros rapazes da sua idade: alto, bonito, magro, preocupado em vestir-se bem. No fundo, ele pretendia agradar a toda a gente.


Jules Sullivan


No entanto, Jules era bem mais do que isso. Ele era um filho pródigo. Bom aluno, respeitador, educado. Tinha quase sempre as melhores notas do liceu e devido à sua constituição física, era bom aluno em desporto. Com cabelos ruivos e um sorriso maroto, não lhe era nada difícil arranjar namoradas. 

Mas… 

Não era bem isso que ele queria para a vida dele.


Jules adorava o Outono. Ele era um rapaz de dezasseis anos. Nascera e crescera naquela cidade, embora ambicionasse um dia pegar nas suas coisas e partir à descoberta do Mundo, tal como haviam feito a sua mãe, Laura, e a sua irmã mais velha, Bianca. Jules era um rapaz igual a tantos outros rapazes da sua idade: alto, bonito, magro, preocupado em vestir-se bem. No fundo, ele pretendia agradar a toda a gente.


Ao regressar da escola, vindo daquele que fora o seu primeiro dia de aulas do novo ano escolar, Jules decidiu parar pelo caminho. Uma leve melodia ecoava no ar. Era uma melodia triste, melancólica. Uma melodia que Jules poderia descrever como sendo perfeita para aquele final de tarde. Ainda estava um pouco de calor, pelo que ele se sentou no chão, encostado a uma árvore no jardim da sua casa, para tentar averiguar de onde viria a melodia. Cedo compreendeu que ela vinha de algum sítio, mas não ali perto. A melodia não era contínua. O vento é que a trazia até ele. Curioso, ele decidiu partir em busca da melodia. Afinal, ela não podia estar a ser tocada muito longe dali! Decidido, começou a correr, rezando para que a melodia não terminasse antes dele a encontrar. Não demorou a chegar a um dos muitos bosques que existiam em Grace Falls. 

Chegado lá, Jules colocou as mãos nos ouvidos em forma concha e fechou os olhos. Fora a coisa certa a fazer. A melodia vinha de dentro do bosque! Jules sorriu feliz. Agora ele conseguia escutar a música perfeitamente! Entrou na floresta e fechou os olhos. Deixou que os ouvidos o guiassem naquela viagem. 

Ele não tardou a chegar a uma clareira, onde um rapaz tocava uma melodia, em frente de um riacho! Pé ante pé, Jules aproximou-se. Não queria perturbar o rapaz. Ele avançava com cuidado. Não se apercebeu que o terreno ficava mais íngreme e inclinado. Assim, Jules tropeçou, fazendo um grande estardalhaço! O rapaz que tocava a melodia levantou-se, sobressaltado!

- Ai, ai, ai! O meu joelho! - gemeu Jules, agarrando-se ao joelho esquerdo, que sangrava.

- Tu estás bem? Magoaste-te? - perguntou o rapaz, aproximando-se de Jules com um ar preocupado.

- Dói-me o joelho! Ao cair acho que caí mal e dei com ele em alguma pedra! - queixou-se Jules, tentando levantar-se.

- Espera aí! Eu ajudo-te! Vá, coloca-te assim, para eu ver isso! - respondeu o rapaz, com delicadeza.

Ele não parecia zangado por Jules tê-lo interrompido. O rapaz ajudou o Jules a sentar-se e foi ao riacho buscar um pouco de água para limpar a ferida, que afinal não passava de alguns arranhões.

- Não te preocupes! Não é desta que morres…! - respondeu o rapaz, com voz divertida. - Já te limpei os arranhões e agora…

O rapaz levantou-se e afastou-se, como se procurasse algo. Jules queria levantar-se para o acompanhar. O rapaz, que estava de costas para ele, gritou:

- Deixa-te estar aí, quieto! Eu estou à procura de umas folhas que te vão ajudar a aliviar o ardor dos arranhões! Ah, aqui está! Com licença, Mãe Terra! - declarou o rapaz, com ar cerimonial, enquanto retirava gentilmente um bocadinho de uma planta verde com flores laranjas e vermelhas.

Satisfeito, o rapaz regressou para junto de Jules e explicou:

- Vou friccionar o teu joelho com a seiva desta planta. Ela chama-se babosa e é muito boa para cicatrizar arranhões e queimaduras provocadas por fricção.

- Ok… - gemeu Jules, admirado pelo rapaz estar a ajoelhar-se perante ele e esfregar a planta no seu joelho.

Instantes depois, Jules começou a sentir um alívio imenso no ardor! Gemeu levemente e suspirou. A noite não tardaria a chegar. O sol estava-se a pôr, fazendo incidir os seus raios sobre a floresta e sobre os cabelos daquele rapaz que o estava a ajudar.


Jules cruza-se com um misterioso rapaz! Quem será?


Os cabelos do rapaz pareciam uma pira de fogo, tal era o brilho provocado pelos raios do sol naquele momento. Ele tinha uma longa cabeleira castanha-avermelhada. Os seus olhos eram acinzentados, mas com o reflexo daquela luz do entardecer, também eles pareciam flamejar.

Jules recordou-se de algo, ao escutar um sino. Muitas pessoas estavam a mudar-se para Grace Falls, graças à publicidade feita nas televisões, tanto ao ar puro, como à boa qualidade de vida. Aquele rapaz devia ser um dos novos residentes. Jules tinha ouvido qualquer coisa sobre o assunto. Sabia que entre os novos moradores estava uma família de indígenas, mas Jules não aprofundara o assunto. Afinal, ele nunca tivera interesse em coscuvilhar a vida das outras pessoas, ao contrário da maioria da população da cidade.

Grace Falls era uma pequena cidade que, em muitos aspectos, parecia parada no tempo. Rodeada de frondosos carvalhos, as construções eram na sua grande maioria em madeira, numa arquitectura misturada entre o estilo colonial e o vitoriano. As casas remontavam a tempos idos, algumas com vários séculos, aquando da chegada dos peregrinos, na sua maioria, alemães e escoceses.


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Grace Falls

Os edifícios mais recentes já eram construídos em tijolo. Apesar disso, os proprietários exibiam com orgulho placas de pedra gravadas, que datavam os edifícios como sendo dos finais do século XVIII e século XIX. Também existiam os edifícios governativos, restaurados recentemente. Entre eles, estavam a Câmara Municipal e o Banco. Ambos erguiam-se, imponentes, em granito cinzento.     

A população em peso ia aos domingos assistir ao sermão na igreja. A igreja de Grace Falls ficava bem no centro da cidade. Lá faziam-se quermesses e bazares comunitários, com o objectivo de ajudar as pessoas necessitadas, não só da cidade, mas de cidades ao redor. Tingida em cor de salmão, a igreja tinha uma torre enorme, onde se encontrava um dos símbolos turísticos da cidade - um sino, que viera da Europa com os primeiros peregrinos. Aquele era o sino que Jules escutava ao longe.

- Estás bem? Estás a ouvir-me? Hey! - exclamou o rapaz, levantando-se.

- O quê? Hã? Desculpa, estava distraído… - respondeu Jules, preparando-se para se levantar.

- “Distraído a observar-te…” - pensou Jules, rindo-se para si mesmo.

- Estava a dizer que já não deves ter mais dores agora. A pele já absorveu a seiva totalmente. Se quiseres, eu acompanho-te até casa! Já está a anoitecer e mesmo sem esse ardor, vais ter algumas dificuldades em andar, durante um ou dois dias… - observou o rapaz, com um ar amigável.

- Hummm… Obrigado! Eu aceito! - acenou Jules, enquanto o rapaz o ajudava a levantar.

- Vamos lá…! Eu não quero chegar tarde a casa, senão tenho de ouvir da minha mãe! - suspirou o rapaz, sorrindo abertamente. - Já agora… Ainda não nos apresentamos. Eu sou o Matoskah. E tu?

- Matoskah? Então és mesmo um índio! - respondeu Jules com um sorriso. - Quer dizer, eu pensei que fosses um descendente deles ou assim, percebes? Ohmm…! Desculpa, estou a ser um parvo… O meu nome é Jules! - rematou, corado que nem um tomate.

- Tudo bem! Muito prazer, Jules! Podes tratar-me por Matoskah. Acho que será mais fácil assim… - rematou, enquanto dava um forte apertão de mãos a Jules.

- Não me leves a mal, por favor… Não estou habituado a conhecer pessoas como tu! - suspirou Jules.

No seu íntimo, Jules sentia que estava a enterrar-se cada ainda mais.

- Vamos andando, está bem? - respondeu Matoskah, com ar seco.

E assim, Jules e Matoskah desceram a floresta, rumo à cidade. A noite já tinha caído quando Jules entrou em casa. Ao fechar a porta, ele não pôde deixar de reparar em como Matoskah andava. Ele caminhava descalço, com uma passada firme e decidida.   


[Continua...]

2 comentários:

  1. Gostei mas creio que já li este recap anteriormente :)

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    1. Olá Francisco!
      Tens toda a razão, eu já publiquei parte da saga no meu anterior blog, embora existam algumas mudanças e também a continuação da história, que não cheguei a publicar anteriormente.

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