08 julho 2020

Escrito nas Entrelinhas: Parte 1 ~ Capítulo 4


Capítulo 4


*21 de Outubro*




- “Olá boa noite, senhores telespectadores! Eu sou a Cher Salles! Sejam bem-vindos à emissão da noite da GFNews, as notícias de Grace Falls! Depois de ontem ao fim da tarde as autoridades locais terem unido esforços com a médium Agatha Flocks, foi finalmente encontrada a jovem Christine Bolt! Infelizmente, Christine foi encontrada já sem vida e tudo indica que já terá morrido há mais de uma semana! O corpo da jovem foi encontrado num avançado estado de decomposição, num vão de escadas de um barracão abandonado nas imediações da cidade. O funeral da jovem está marcado para amanhã, às 11 horas, na igreja local. Os pais da jovem estão muito arrasados com a notícia, pois mantiveram até ao último instante, a esperança que a filha tivesse fugido de casa e continuasse viva.

Jules e o pai encontravam-se a jantar enquanto escutavam as notícias. Ao saber da morte da amiga, Jules deixou cair o copo de sumo ao chão, olhando para a televisão escandalizado!

- Nãooo! Christine!! - gritou.

- Filho… -  suspirou Eddie, tentado confortar Jules.

A repórter continuou:

- “Trata-se de uma tragédia que parece estar a abater-se sobre a nossa cidade. Foram reportados ontem mais dois desaparecimentos: uma rapariga chamada Patie Williams, de apenas 14 anos…


Patie Williams


Uma fotografia surgiu no ecrã e Cher prosseguiu:

- “… Patie é uma menina de cabelos castanhos-escuros, com franja, algumas sardas e estatura forte. Os seus olhos são castanhos-aveludados. A última vez que foi vista foi ontem de manhã, a sair de casa para ir para a escola.


Outra fotografia surgiu no ecrã:


Daniel Masters


- “Quem também foi visto ontem de manhã pela última vez foi Daniel Masters, um jovem de 15 anos. Ele é magro, elegante, de cabelos castanho-arruivados, olhos verdes e tez muito clara. Os vizinhos declararam à GFNews que Daniel é um rapaz estranho e pouco falador. Neste momento, a polícia especula que estes dois desaparecimentos possam estar relacionados. Apesar de ambos frequentarem o liceu de Grace Falls, os colegas de turma de ambos os jovens desconhecem se Patie e Daniel teriam algum tipo de relacionamento.

- Oh meu Deus! Isto é horrível! Eu conheço-o! - gritou Jules, começando a chorar, quando viu a fotografia de Daniel.

- “A polícia encontra-se totalmente disponível para receber informações que conduzam ao paradeiro destes dois jovens. Nos últimos seis meses e com mais estes dois casos, sobe para sete o número de pessoas que desaparecem misteriosamente, nos Estados do Nebraska, Dakota do Sul e Dakota do Norte! O comissário da Polícia de Grace Falls, Henry Larson, emitiu um comunicado há minutos, alertando para que todos os habitantes da cidade, principalmente aqueles que têm filhos em idade escolar, estejam atentos aos movimentos dos mesmos, mudanças no seu comportamento e também a textos suspeitos na rede social “Criss-Cross”! O nosso estimado reverendo, Father Simon, já apresentou as condolências à família de Christine e afirmou estar a rezar piamente para que Patie Williams e Daniel Masters sejam encontrados sãos e salvos e tudo isto não tenha passado de um devaneio de adolescentes. Quaisquer informações sobre o paradeiro de Patie ou de Daniel, devem comunicá-las à Polícia de Grace Falls ou através do número…

Vendo o estado de Jules, Eddie desligou a televisão. Como este não parasse de chorar, Eddie encaminhou-o para a cama, dirigindo-se à cozinha para lhe preparar um chá. Pelo caminho pegou num comprimido e levou também umas bolachas de chocolate que Jules adorava. Pouco depois, pegou numa bandeja e levou até ao quarto do filho. 

- Toma Jules, bebe isto! Vai-te fazer bem! - ordenou.

- O que é isto, pai? - perguntou Jules, apontando para o comprimido e começando a mastigar as bolachas.

- Valium. Hoje precisas de uma boa noite de sono. Toma o chá com o comprimido, come as bolachas e nada de ouvir música. Vais dormir que amanhã tens de ir ao funeral da pobre miúda…

Recomeçando a chorar, Jules fez o que o pai lhe disse. Comeu as bolachas todas, tomou o comprimido e bebeu o chá de um só trago. Rapidamente sentiu-se sonolento. O pai pegou na bandeja, deu-lhe um beijo na testa e saiu do quarto, fechando a porta atrás de si.


*22 de Outubro*


O dia amanhecera cinzento. Parecia reflectir o estado de espírito da comunidade de Grace Falls. Christine era conhecida por ser uma rapariga afável, educada e prestável. Porque teria cometido suicídio? Essa era a pergunta que ia na boca de toda a gente. A igreja da cidade estava lotada quando chegou a hora da celebração. Para espanto de muitos presentes, Matoskah, Takoda e os pais foram assistir à celebração, deixando um bonito ramo de flores no caixão de Christine.

- Que raios estão eles aqui a fazer? Nem conheciam a miúda! - cochichavam algumas pessoas.

Father Simon apareceu, vestindo uma túnica preta com bordas violetas. Ele era um senhor de meia-idade, de média estatura, com cabelos pretos, curtos. O seu rosto era bonacheirão, embora naquele dia estivesse bastante pesaroso.

- Amados irmãos e irmãs, encontrámo-nos aqui hoje para celebrar um triste acontecimento. A jovem Christine Bolt deixou-nos ainda na flor da idade. Olhando para a plateia, vejo aqui muitos jovens da idade da Christine. A vós, meus filhos, peço-vos que tenham a sabedoria de não optar pelo caminho mais fácil. A vida por vezes é dura. Todos o sabemos. Mas, mesmo assim, vale a pena ser vivida até ao fim. Eu já fui adolescente, como foram também os vossos pais, tios, avós e outros familiares. Sei bem como custa enfrentar a fase das borbulhas no rosto… - gracejou, tirando alguns pequenos sorrisos de algumas pessoas. - Eu penso que não estou a dizer nenhuma blasfémia ao afirmar que conhecia bem a jovem Christine, apesar de eu estar entre vós há pouco tempo. Ela era uma menina de coração puro, humilde e um ombro amigo para alguns de vocês. Muito dedicada à igreja, participando activamente nas actividades da nossa comunidade. Oremos, meus filhos e irmãos, para que Deus acolha esta pobre alma no Eterno Descanso. Ámen.

- Ámen. - responderam todas as pessoas.

Father Simon abriu os braços e disse:

- Em momentos conturbados como este, é importante que a nossa comunidade esteja unida. Vamos dar as mãos, meus filhos e irmãos. Vamos rezar em silêncio pela alma da Christine e também pelos jovens Daniel e Patie, que continuam desaparecidos. Que eles apareceram depressa, sãos e salvos.

- Que assim seja! - afirmou toda a assembleia, dando as mãos.

Quando chegou o momento de dar as mãos, Jules, que se sentia pessimamente, sentiu uma mão firme e quente a pegar na sua mão. Levantou a cabeça e olhou para o lado. Era Matoskah. Este olhava para Father Simon, com um olhar ininteligível, mas sereno. O coração de Jules começou a bater mais depressa e corou um pouco, baixando a cabeça e fechando os olhos. Aquele calor que Matoskah lhe transmitia era tão agradável!

Quando deu por si, Jules abriu os olhos e apercebeu-se que a população se mobilizava para o cemitério da cidade, com os pais de Christine a chorarem em altos prantos, junto com inúmeras pessoas, em especial colegas de turma e amigas de Christine.

Matoskah oferecera-se para ajudar a transportar o caixão, junto com o pai, atitude que caiu muito bem entre os presentes. Jules ficou a vê-los partir, em passo solene, enquanto o coro da igreja os acompanhava cantando, enquanto desciam o caixão à terra e alguns populares lançavam terra ao mesmo, junto com flores e objectos na derradeira despedida:



[Nota do Autor - Quando eu cantava no Coro da Igreja, este era o meu tema musical favorito. 
É um tema que se cantava na altura da Comunhão.]



Se me envolve a noite escura
E caminho sobre abismos de amargura,
Nada temo porque a Luz está comigo!
Nada temo porque a Luz está comigo!

Se me colhe a tempestade
E o mar vai engolir a minha barca,
Nada temo porque a Paz está comigo!
Nada temo porque a Paz está comigo!

Se me perco no deserto
E de fome me consumo e desfaleço,
Nada temo porque a Fonte está comigo!
Nada temo porque a Fonte está comigo!

Se os amigos me deixarem
Em caminhos de miséria e orfandade,
Nada temo porque o Pai está comigo!
Nada temo porque o Pai está comigo!

Se os descrentes me insultarem
E se os ímpios mortalmente me odiarem,
Nada temo porque a Vida está comigo!
Nada temo porque a Vida está comigo!

Se mais nada me restar
E no Mundo só achar desilusões…
Nada temo porque o Céu está comigo!
Nada temo porque o Céu está comigo!


Jules chorava copiosamente ao escutar aquela canção. Para ele, era uma canção extremamente bonita e reconfortante. Também ele pegou num pouco de terra, soprou-a para o caixão de Christine e disse, num murmúrio:

- Perdoa-me por alguma coisa, Christine…

O pai de Jules aproximou-se do filho e abraçou-o. Este começou a chorar ainda mais. Eddie podia ter muitos defeitos, mas era um bom pai. Por toda a parte, viam-se pessoas abraçadas a chorar. Matoskah e a família abandonaram discretamente o cemitério, quando Takoda começou a chorar muito emocionado. Ele nunca tinha presenciado um funeral e ficara bastante impressionado.


[Continua...]

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