07 dezembro 2019

Vírgulas do Destino: Prisioneiros do Amor ~ Capítulo 22

Capítulo 22




*Enquanto isso, em Barcelona...*

- ¿Mikel?¿Eres tú?

Mikel virou a cabeça, surpreendido! Ofuscado pelo sol, não reconheceu logo os dois vultos que subitamente apareceram! Ao reconhecê-los, sorriu abertamente e abrindo os braços, exclamou:

- ¡Kimeru! ¡Dora!

Duas mulheres aproximaram-se dele sorridentes e cumprimentaram-no. Kimeru, a irmã de Ángel, continuava idêntica. Elegante, um pouco mais baixa do que ele, tinha cabelos castanhos-escuros, curtos. Os seus olhos eram verdes, num tom verde-seco.

Dora era uma mulher quarentona, de média estatura, elegante. Tinha cabelos pretos, compridos. Os seus olhos eram castanhos-claros. O seu sorriso era genuíno. Depois de Mikel cumprimentar as duas, estas colocaram flores na campa de Ángel e ficaram a contemplar a campa em silêncio, durante algum tempo. Mikel afastou-se subtilmente. Alguns minutos depois, Kimeru e Dora vieram ter com ele. Este virou-se para Dora e perguntou:

- Há quanto tempo! É incrível que de todos os locais possíveis para a reencontrar, tenha sido logo este! Porque está aqui?

Com um largo sorriso, Dora respondeu:

- Se bem se lembra, eu fui professora do Ángel, no colégio onde ele estudava. E o Mikel?

Mikel apontou para a lápide e suspirou:

- Eu sou o Ōkami...

Um lampejo de compreensão desceu sobre o rosto de Dora. Com ar triste, ela baixou a cabeça e suspirou:

- Lamento muito, Mikel... Só lhe posso dizer que o Ángel foi muito, mas mesmo muito feliz, depois de o ter conhecido! Eu fui professora dele durante alguns anos, conheci-o desde que ele entrou para o ensino básico. Ele sempre foi um rapaz muito quieto e sossegado. Por ser assim, era incompreendido e solitário... Mas… Isso mudou no dia em que conheceu o famoso “Oka-chi”. Aí, ele passou a andar muito bem-disposto e feliz, tornou-se a alma do colégio! Sempre sorridente, brincalhão e bastante traquinas! 

Emocionada, Dora rematou:

- Nem parecia a mesma pessoa! O Mikel mudou a vida dele... - sussurrou Dora, com as lágrimas a caírem-lhe pelo rosto.

Mikel suspirou e desabafou:

- Ele mudou a minha vida, sabe? Eu sempre tive um coração puro... Mas com o tempo, com as amarguras da vida, aos poucos, deixei de acreditar nas pessoas, de confiar, de sonhar. Passei a isolar-me e a fechar-me. Um dia, conheci o Ángel... E as coisas mudaram. De início, eu era muito frio. Falava de uma maneira que magoaria outras pessoas, mas ele entendia o que eu sentia. Afinal, ele também era assim, também usava aquela “máscara”, com a maior parte das pessoas. Eu fiquei surpreso porque ele mostrava que me compreendia e que sabia o que eu estava a sentir. Do nada, ele perguntou se me podia dar um abraço. Eu ri-me e disse-lhe que sim... Foi dos melhores abraços que recebi até hoje! Deste então, eu passei a cumprimentar as pessoas com abraços! É das melhores formas de mostrar o quanto gostamos delas! 

Dora e Kimeru sorriram. Todos afastaram-se do túmulo, dirigindo-se para o carro de Kimeru. A irmã de Ángel convidou Mikel para almoçar, enquanto Dora se despediu de ambos. Ela iria regressar ao colégio, onde voltara a dar aulas, depois de ter estalado a guerra em Portugal.

Enquanto isso, Kimeru levou Mikel para o seu apartamento, onde vivia com Teixeira, a sua companheira. O apartamento delas era grande e ricamente mobilado. Tinha jacuzzi, 3 quartos, uma sala bastante acolhedora, uma cozinha bem apetrechada. Era um espaço jovem e bastante moderno. Teixeira chegou pouco tempo depois, enquanto Mikel ajudava Kimeru fazer o almoço. Ela tinha cabelos castanhos claros, longos, presos por um elástico. A sua pele era clara e os seus olhos eram azuis, um azul glacial, mesmo bonito. Os três amigos ficaram a conversar durante bastante tempo. Falaram de tudo um pouco. Entretidos com a conversa, nem deram pelo passar das horas. Mikel pretendia voltar a Madrid nesse mesmo dia, mas Kimeru insistiu para que ele ficasse e descansasse.

- ¡Ya pasaste por mucho, unos días de descanso te haceran bien!

- No lo sé... Bueno, me quedo por aqui esta noche. ¡Sigo para Madrid mañana!

E assim, Teixeira encaminhou-o para um dos quartos de hóspedes. O quarto era grande e tinha 
varanda, varanda essa que tinha vista para o oceano. Foi com surpresa que Mikel descobriu que o quarto tinha uma casa de banho completa. Ele aproveitou para tomar um banho de espuma, relaxante. Depois disso, dirigiu-se à varanda, nu, onde se sentou a apreciar o pôr-do-sol. 




Pegou no telemóvel e telefonou a Howl. Este atendeu quase de imediato, perguntando-lhe quando regressava.

- Devo regressar nos próximos dias...

- Espero bem que sim! - suspirou Howl.

- Não te preocupes! 

- Ainda estás em Espanha?

- Sim, estou em Barcelona!

- Estás a gozar! Tu estás em Barcelona? - exclamou Howl, incrédulo.

De repente, Kojiru entrou no quarto, no preciso momento em que Howl dizia aquilo.

- Lord Yusuke está em Espanha? - perguntou.

Howl ficou atrapalhado, a olhar para Kojiru. Mikel escutou a voz de Kojiru e rematou:

- É melhor desligarmos agora. Já percebi que o Kojiru está aí. Não vale a pena mentir-lhe... Podes contar-lhe a verdade... Mas ele que não revele a ninguém o meu paradeiro! Vocês estão a ser espiados!

- Está combinado! Manda mensagem! Abraço!

- Abraço!

Desligaram. 

Kojiru olhava para Howl com uma expressão divertida. Não parecia zangado. 

Howl sentou-se na cama e convidou-o a sentar-se também. Suspirando, explicou-lhe tudo o que se andava a passar. Falou durante uns quinze minutos, sem parar. Por duas ou três ocasiões, Kojiru sentira vontade de perguntar algo, mas decidira aguardar que Howl acabasse de falar para expôr as suas dúvidas.

- Sim senhor, muito bem! Howl, obrigado por me contares tudo! Prometo que fica só entre nós! Então Lord Yusuke foi visitar a campa do Tenshi?

- Não sei, deve ter ido. Afinal ele está em Barcelona...

- Bom… Não sei se tu sabes, mas faz hoje 4 anos que o Tenshi morreu... Acredito que para o Lord Yusuke era mesmo importante fazer esta viagem! Eles eram muito unidos. Foi um choque muito grande… Não consigo imaginar como é que ele se deve ter sentido... Enfim… Tu deves ser a primeira pessoa que Lord Yusuke deixa aproximar-se dele, desde a morte do Tenshi...

- Hum... - murmurou Howl, sem saber o que dizer.

- Acredita que isto é um elogio muito grande, Howl! Mais do que possas imaginar!

- Obrigado, Kojiru...! Eu não estou habituado a receber elogios, por isso fico sempre sem saber o que dizer…

- O que achas de irmos jantar fora? Só os dois?

Howl sorriu.

- Podemos comer uma americana?

Kojiru desatou a rir.

- Uma americana, uma francesa… O que tu quiseres!

Com um grande sorriso, Howl piscou-lhe o olho e os dois saíram para jantar.

*Enquanto isso, em Barcelona...*

Mikel estava a perdido em pensamentos, quando Kimeru bateu à porta. Passado uns instantes, esta abriu-se e Mikel apareceu, com uma toalha enrolada no corpo.

- ¿Hoy, quieres ir a cenar fuera?

- ¡Sí! ¡Claro!

Meia hora depois, os três amigos foram jantar fora, passeando pelas zonas mais emblemáticas de Barcelona. Quem os visse, pensava que eram um casal, tal era a cumplicidade que se gerara entre todos! Ao passarem pelo estádio do Barcelona, Mikel não conseguiu disfarçar o entusiasmo! Intrigadas, as amigas perguntaram o motivo.




- ¡Saben, es que tengo un pupilo que ama el Barça!

- ¿Verdad?

- ¡Sí, su sueño es juegar en Barcelona! ¡Y yo estoy cierto que sí, que su sueño se hacerá realidad un día!

Divertidos, dirigiram-se à loja do Barcelona para comprar uma prenda para Howl. Decidiram dar-lhe uma camisola com o número 9, já que este era o seu número favorito. No dia seguinte, Mikel despediu-se de ambas, prometendo voltar um dia, quando a guerra terminasse. Apanhou um comboio para Madrid, onde iria ser visto por um Urologista.




A clínica do Dr. Sanchez era bem no centro de Madrid. Não teve de esperar muito. O Dr. Sanchez explicou a Mikel tudo o que se estava a passar com ele e disse-lhe que apesar de ser um cancro raro, uma vez que só 2% dos cancros masculinos são nos testículos, este tipo de cancro era também dos mais curáveis, com 95% de taxa de cura, depois do tratamento. O que Mikel mais temia era precisamente isso, o tratamento. Infelizmente, quanto a isso, não havia volta a dar. Ele teria de fazer uma cirurgia para extracção do tumor, além de ter de fazer radioterapia e quimioterapia, uma vez que já havia antecedentes cancerígenos na família.

- ¡Pero! ¡Pero! Asi... ¡Asi dejaré de me sentir un hombre! - explodiu Mikel, quando o Dr. Sanchez terminou a explicação.

- ¡No..! Hoy en día existen maneras de contornar lo problema. ¡Podemos poner una prótesis testicular en retorno! ¡Usted seguirá haciendo una vida perfectamente normal, despues de pasar esta fase de los tratamentos!

- Bueno.. espero que sí... - suspirou Mikel, fatigado.

- No se preocupe. ¡Usted es un joven! ¡Todo se va bien!

Com um sorriso paternalista, o Dr. Sanchez escreveu um relatório que Mikel teria de entregar no IPO da cidade do Porto, para dar início aos tratamentos. Deu-lhe uma série de conselhos e não tardou muito para que a consulta chegasse ao fim. Um bocado triste com o futuro que se aproximava a passos largos, Mikel procurou um hotel onde se instalar. Não tinha forças para regressar a Portugal naquele momento. 

Precisava de assimilar primeiro tudo o que tinha ouvido. Foi até um cybercafé onde procurou na Internet um local acolhedor. Não demorou muito a encontrar o que desejava. Em poucos minutos estava a apanhar um táxi que o levou rapidamente ao hotel Husa Princesa. 




O hotel era muito requintado e luxuoso. Todos os quartos possuíam algo muito especial. Esse tinha sido o principal motivo para Mikel optar por este hotel: cada quarto tinha uma cópia de uma pintura famosa do Museu do Prado.

Quando entrou no quarto, ele exclamou um “Oooohhhh!” de espanto! Pousou as coisas e atirou-se para cima da cama! Deixou-se estar assim durante alguns minutos, sem pensar em nada, simplesmente a olhar para a pintura que tinha na parede por detrás da cama. Passado algum tempo, despiu-se e foi tomar um banho. Vestiu um robe e preparou um café, enquanto observava pela janela a paisagem. Mais calmo e relaxado, decidiu passar um pouco pelas brasas, até à hora de jantar. Já era noite cerrada quando despertou, decidido a aproveitar o momento.

A “siesta” tinha-lhe feito bem. Mais bem disposto do que estivera o dia todo, vestiu-se e decidiu passear pela zona, tentado a divertir-se o mais que podia. Depois de comer um prato típico, Tripas ao estilo de Madrid, seguiu para uma zona de bares, onde procurou um local sossegado para beber algo e ouvir boa música. Depois de várias tentativas, acabou por parar num local chamado “La Fídula”.




O local era bastante agradável e acolhedor. Não era muito grande. Fez-lhe lembrar um bar de jazz de New Orleans ou de San Francisco, como às vezes via nos filmes! Sorrindo feliz, sentou-se numa mesa e pediu algo para beber. Naquela noite, além do jazz, “hay una participacion especial”, disse a empregada que o serviu, virando costas antes de responder a Mikel que participação era essa.

O bar não tardou a encher-se de turistas e residentes. Pelos vistos, as noites 

temáticas eram populares. O público era todo jovem e o ambiente era bem-humorado e divertido. Em poucos minutos, uma pluralidade de línguas escutava-se ali e Mikel esqueceu-se de todos os seus problemas, deixando-se envolver pela música ambiente e por um grupo de italianos que divertiam toda a gente com as suas canções à desgarrada. Algumas horas mais tarde, eis que chegou o ponto alto da noite - a tal participação especial. A gerente do bar veio ao microfone e disse:

- ¡Buenas noches! ¡Hoy tenemos una invitada muy especial! ¡Ella ha venido de México y nos presentará a su último trabajo! ¡Con ustedes, Daniela Gonzalez!!

As pessoas presentes no bar levantaram-se para saudar a artista, que iria tocar piano! Mikel, ao ouvir aquele nome, ergue-se de rompante, completamente chocado e gritou:

- ¿Danny?

A rapariga, ao ouvir aquele nome, virou-se. Ao olhar para Mikel, ela sorriu, mal acreditando no que os seus olhos viam! Correu para ele e abraçou-o com toda a força!


Daniela

- ¿Como?¿Como es eso posible? - perguntou Mikel.

- ¡Asi es! ¡Cuanto tiempo! - gritou Daniela, dando beijinhos a Mikel.

- ¿Mejor hablarmos despues, no? - sussurrou Mikel, entre risos.

Daniela acenou com a cabeça e sentando-se ao piano, explicou o que acontecera - ela e Mikel tinham sido namorados alguns anos antes e com o passar do tempo, tinham perdido o contacto! Era por causa de Mikel que ela não desistira do sonho de ser pianista e chegara inclusive a escrever uma composição dedicada a ele! O público assobiou entusiasmado e bateu palmas, pedindo a Daniela para tocar a tal música. Ela assentiu com a cabeça, afirmando que a tocaria no fim daquele mini-concerto.
Mikel estava estupefacto! A viagem a Espanha já há muito que estava na sua mente, mas estava longe de imaginar as surpresas que a viagem lhe tinha reservado! Daniela estava ainda mais bonita que na altura em que namoraram. Ela era de média estatura, forte, cabelos pretos, pelo meio das costas. 

- “Deve andar em tournée por Espanha...” - pensou Mikel.

Ela estava vestida com um lindo vestido verde esmeralda, que contrastava com o vermelho ardente do batom que usara. Os seus olhos, grandes e negros, continham aquela paixão e calor sul americanos, que encantara e cativara Mikel da primeira vez. Este suspirou. Enquanto ela tocava as peças, uma atrás da outra, ele ia recordando momentos.

Eles tinham-se conhecido em San Diego, na Califórnia, quando Mikel estivera por lá a trabalhar. Recordou-se do namoro deles. Dos ciúmes de ambas as partes. Dos medos. Da paixão. Das dúvidas causadas por um amor vivido à distância e a posterior separação. A dada altura, Daniela pediu para baixarem as luzes e criou-se assim um ambiente mais intimista. Mikel despertou das suas memórias mesmo a tempo de escutar uma música que lhe era bastante familiar...




[Daniela]

Soñando
Debo estar soñando
¿O realmente estoy aqui contigo?

Baby
Me llevas en tus brazos
Y aunque estoy despierto
¡Sé que mi sueño se está volviendo realidad!

Y aunque me
Acabé de enamorarme otra vez
Un solo toque y todo se repiete de nuevo

Ahí voy yo
Acabé de enamorarme otra vez
Y cuando lo hago
¡No puedo ayudarme a mí misma, me enamoré por ti!

Magia
Debe ser magia
La manera en que me abrazo a ti y la noche paresque volar

Fácil
Para ti llevarme a una estrella
¡El ciello es ese momento cuando miro tus ojos!


Y aunque me
Acabé de enamorarme otra vez
Un solo toque y todo se repiete de nuevo

Ahí voy yo
Acabé de enamorarme otra vez
Y cuando lo hago
¡No puedo ayudarme a mí misma, me enamoré por ti!
¡No puedo ayudarme a mí misma, me enamoré por ti!


O público presente levantou-se e aplaudiu de pé, numa grande ovação. Daniela sorriu e fez uma vénia a todos os presentes, cruzando olhares com Mikel. Este sorriu também. Quando os ânimos serenaram, Daniela veio ter com ele e ficaram à conversa durante bastante tempo, até o bar fechar. Nessa altura, Mikel perguntou-lhe onde estava hospedada, ao que Daniela disse que estava num hotel do outro lado da cidade.

- Bueno, ¡eso es muy lejos y ya es muy tarde! ¿Que tal se hoy pasarmos la noche juntos? - perguntou Mikel.

- ¡Me encantaría, cariño! - respondeu Daniela, levando a mão à boca.

E assim, os dois seguiram para o hotel onde Mikel estava hospedado. Chegados ao quarto, Daniela pediu para tomar um banho. Mikel acenou com a cabeça, distraído. Só quando viu Daniela a despir-se é que se apercebeu do que ia acontecer. Corando imenso, ele virou costas, pé ante pé, enquanto se ria para si mesmo...


[Continua...]

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